quinta-feira, 5 de maio de 2011

Minha massa

Quando caminho na cidade vejo um vilarejo. Um vilarejo de cegos, surdos e mudos. Nesse vilarejo, há pessoas de todos os estilos e padrões de vida. Há os ricos, há os pobres, há os falantes e há os ouvintes. E em meio a essa contradição amorosa, sigo o caminho em busca das respostas. No mundo que visito, as respostas caem do céu, porém são tantas que você quase nunca se depara com uma na frente.

Creio que eu precise de um pouco de fé. Nesse mundo de ilusões esperançosas, mendigo é poste e miséria é arte. Se a comida de quem tem fome trouxesse o relógio de quem não perde tempo, a matemática casaria. O laranja quando aceso, solta fumaça, e neste cinzeiro humano onde as incertezas tomam conta, só se protege das cinzas, quem sabe fumar. Algumas lembranças aqui, outros acontecimentos acolá e tudo para mim é como se fosse uma coisa só, sonho.

Entender a complexidade da vida nessa altura do campeonato é algo que eu não gostaria que estivesse acontecendo. No tempo determinado que isso ocorre, acabo prestando atenção demais em situações, animais, plantas e acabo percebendo o quão fascinante é, depois de observar tudo isso, ainda conseguir escrever isso de forma ordenada, onde meus pensamentos guiam-se por caminhos que eu não faço idéia de onde surgem. Quando olho para o meu cachorro e vejo-o com aqueles olhos brilhantes e carentes, logo percebo que talvez ele me olhe da mesma forma.

Pergunto-me qual a intensidade de uma criação a partir do momento em que uma simples idéia aflora em forma de pensamentos construtivos. Para mim, o fax, um simples telefone que envia papel para outros telefones, ainda é muito criativo e eu não entendo a complexidade do mesmo. Quando caminho por um shopping qualquer e vejo as tecnologias de prateleira prontinhas para serem consumidas pelos mais sedentos seres, faço uma análise um pouco pessimista sobre nossa atualidade. Vejo que embora o dinheiro possa comprar inúmeros ‘’mimos’’ tecnológicos, talvez ele não consiga comprar a consciência para decidir se aquilo deve realmente ser comprado.

Certo dia quando voltava para casa, me deparei com um mendigo deitado na calçada com uma manta improvisada e com alguns papéis que se faziam por travesseiro. Embora tais imagens sejam constantes em grandes cidades, não consigo voltar para casa e não pensar a respeito. O simples caminhar humano para lá e para cá beirando a cabeça daquele indivíduo mostra o quão equivocada está a natureza de nossa humanidade.

A evolução da humanidade se dá de forma tão mecânica e rápida que, ao mesmo tempo em que uns acham prazeroso visualizar e tocar seu instrumento comprado, outros se esquecem dos sentidos mais ‘’normais’’ que possuem. Organizar pensamentos de forma construtiva e natural é algo que quase ninguém consegue fazer hoje em dia. Foi dito que o cérebro humano, de pouco mais de 1 quilograma de massa, é o mais complexo e ordenado arranjo de matéria em todo o universo. Suas capacidades e seu potencial desconcertam nossa imaginação como um simples papel que se queima ao entrar em contato com fogo.

Se um cachorro nos pede comida, obviamente sabemos que está com fome. Ao analisarmos o simples fato desse acontecimento, nos deparamos com nosso sentido ‘’direito’’ de fazer as coisas. No esquerdo, há uma complexidade tão majestosa que faz qualquer criação mundana parecer um completo nada. Temos muito a doar. Temos tanto que, os que cobram por ‘’doações’’ implicitamente, nos impossibilitam de agir de forma honrosa e respeitável.

Continuarei andar pelas ruas da cidade, continuarei escrever textos que começam de um jeito e terminam de outro. Continuarei a examinar minha mente constantemente para que eu não me torne louco, mesmo pensando que fazendo isso, eu ficarei. Andar por aí sem sentido algum, todos fazem. Trabalhar para alimentar os anseios e torná-los domesticáveis, todos o fazem e, se não fazem, alguém faz por você.

‘’Quando olho para a imensidade deste céu que me cobre, faço-me voltar para mim e tento descobrir primeiro meu universo, depois o das estrelas.''

Um comentário:

  1. Du, é impressionante como seus textos me deixam perturbada/transformada/comovida, não de forma pejorativa, mas de intensidade... Vc me tira da rotina de uma tarde qualquer e me deixa assim... pensante. Estava com saudade de seus otimos textos.

    Beijo querido.

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